sexta-feira, 31 de agosto de 2007

O banho de mar na Ilha (só por curiosidade)

Em Florianópolis, o banho de mar foi visto como uma forma de lazer muito depois do que imaginamos. Apesar de belissimas, somente a partir da segunda década do século XX, os moradores começaram a pensar nas praias como divertimento e refrigério contra o excessivo calor.
O termo "lazer" (e o próprio ato) não era empregado pelos trabalhadores da Ilha, sendo que não tinham direito às férias e trabalhavam 12 horas por dia. Somente em 1930, no governo de Getúlio Vargas, os trabalhadores ganharam seu ministério. Os dias de descanso se resumiam em dias santos, e nestes, não era permitido muito mais que uma procissão ou uma novena.
A necessidade de lazer cresceu junto à urbanização, e era justamente o homem da cidade quem procurava as praias para sua distração. O homem do campo ainda não procurava o lazer, não eram, na grande parte, assalariados; o sistema do escambo prevalecia.
O Desterro no século XVIII era dividida em funções militares administrativas e pesca, da mesma forma que é feito hoje: tarrafeando com a água no máximo até a cintura. Ironicamente, grande parte dos pescadores ainda não sabem nadar nos dias de hoje.

domingo, 26 de agosto de 2007

Dona Margarida

Pestis eram vivus - moriens tua mors ero.”
Vivo, sou tua peste - morto, serei tua morte.
Martinho Lutero

Há uma velha sentada,
sorrindo frouxo,
com cara de nada, com jeito medonho
de quem espreita o amanhã.

Todos os dias
vejo essa velha horrenda,
gasta, distraída.
E é com a postura corcunda da quase morta
Dona Margarida,
que tenho pesadelos todas as noites.

Parece provocação:
a velha adora sentar-se no jardim,
frente à minha janela.
Quem sabe estaria Dona Margarida pensando
se a morte me chegaria mais ligeiro do que a ela?

De: David Pereira Neto para Carolina

1 colher de chá de insanidade
2 colheres de sopa de mal humor
1/2 xícara de humor sagaz e tosco
2 belas pernas
3/4 sorriso, recém colhido
5 músicas, fatiadas
2 copos de brahma gelada
3 palavras em frânces
4 livros, cortados em rodelas
2 "páras", ralados
2/3 de histórias nostalgicas, sem casca

luxo e lixo à gosto
e um copo d'água ao alcance, por precaução


misture tudo e beba de uma só vez, sempre!

sexta-feira, 24 de agosto de 2007

A mosquinha

A mosquinha, extasiada com a luz de minha sala, dava voltas e voltas ao redor da lâmpada. Larguei meus afazeres para observa-la, justamente por se tratar de um oficio banal. A pobrezinha rodava, rodava e batia contra a lâmpada quente. Tontinha que só ela, descansava na escrivaninha até voltar a si e continuar a rodar, rodar em volta da lâmpada e eu tinha a impressão de que suas asinhas derreteriam e a pequena teria então que vagar por
aí com suas perninhas, como fazem as formigas. Caiu, levantou, entonteceu e suspirou.
Tudo novamente.
Como amante de bichanos que sou, fiz minha contribuição para com esse amável inseto. Da gaveta do armário da cozinha tirei uma das ferramentas do mundo moderno, agora com muito mais potência: a lâmpada fria!
Aconcheguei a lampadinha no lustre da sala, a mosquinha me aguardava ansiosa. Ao que eu liguei a luz, a pequena rodeou, rodeou inúmeras vezes torneando o clarão até sentir-se confiante. Um, dois, três... pousou.Sinto com pesar o que viria a acontecer com a pobrezinha. Ela, de tão encantada (ainda me lembro daqueles grandes olhinhos verdes lacrimejantes...) permaneceu a observar aquele brilho quase que Solar, daqueles longos dias de verão. Observou, observou até que não pôde mais nada observar. Ficara cega e sem rumo. Ao que corri para ajuda-la, veio ao chão, desnorteada, e assim tão de súbito, não pude recuar. Escutei seu estalinho singelo contra meus pés descalços e me causou, apesar da piedade, tamanha repulsa que nunca mais comprei lâmpadas frias.

Nostalgia cadavérica

Um ano inteiro passa
e para o homem,
não há maior desgraça
que um ano que passa ligeiro.

Mas a caveira
acha graça:
o tempo não lhe importa.
Por cima da carcaça,
veste a mesma mortalha
-sempre em moda.

Se lhe importassem as horas,
seria enterrada de relógio.
Mas não é este o caso,
leva consigo, um casaco
para em noites frias, o cortejo acompanhar.

E se o tempo lhe pede companhia,
ninguém melhor
para compartilhar a poesia,
que o velho amigo,
o coveiro.

E daí por diante,
é só alegria
do dia a dia da caveira.

Concentra!

- Concentra!
- Concentrate-te, ou Te concentra?
- “Te” se for teu...
Tipo, “Senta-te” é senta.
Ou se te tiver fazendo fazer algo,
como se fosse “Te senta” ta te fazendo sentar.
- Ta, então é melhor eu pedir pra alguém “Concentra-te”, pois estarei fazendo a pessoa fazer apenas algo que pedi e não o que pedi para ela fazer algo?
- Não sei guri. Concentraí!

Antiquímico

Ah, que agonia
a espera.
Em volta a calmaria,
em mim, um turbilhão!

Desde que essa praga apareceu,
coço-me, como se mil pulgas me mordessem.
O sangue é pouco
mas para mim, é imensidão.

Chegada a resposta
o médico traduz:
-Segundo a amostra,
o melanoma é avançado,
comece a oração!

VISÃO GRANDIOSA

O biquíni anil,
o desfile de toalha,
a forma de barril
e todo o charmeda gorda na praia.

só uma passagem

Minuit à Paris
Mas já não é tão minuit
É periferia
E já não é tão Paris
Passou da meia noite

No même quarto escuro
De todo dia
Encore a même radio
Mas já não é tão Brésil
É outro dia
Em outro país
Na même periferia

Porém aqui ouço jazz
Cancan e rock
Não vejo, no entanto, a mesma alegria
Que meu país trazia
Junto à un gol

E se digo oui
E não yes
Menos mal onde estou
Où tudo que j’ai appris
Fora inventado em outra époque
Para que pour toujours on les invoques
Et les appropre à notre langue

C’est Paris ce mélange
Où nem eu nem personne
Sont felizes
Porque personne n’ose pas
A ser mais que uma époque
E feliz é de quem ici habite e compreende
Qu’ici jaz une patrie morte